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MAGIA E ARTE

 

Uma representação pictórica é uma cerimônia congelada, um gesto prototípico capaz de engendrar um sem-número de outros gestos igualmente harmoniosos. Assim concebiam a Arte os mestres do Renascimento, e esse é o caso da maior parte de suas criações, por exemplo, "A Primavera" de Boticelli, cujo conteúdo mágico e esotérico é evidente, transmitindo as emanações do doce mistério da vida, percebido plenamente pelo autor. Por certo que Leonardo participava deste mesmo tipo de concepção, e se encarregou de demonstrá-lo não só por meio de sua obra plástica, mas também com sua ciência e com o matrimônio desta com sua arte em representações mecânico-teatrais, onde manifestou o modelo cosmogônico mediante um grandioso espetáculo que ofereceu na corte de seus protetores. Shakespeare utilizou também da poesia e do teatro para expressar o esotérico, como deste modo o fizeram os artistas renascentistas, não só italianos, mas também alemães, franceses, flamengos e ingleses (com expressões tão aparentemente afastadas como a construção de jardins simbólicos herméticos, ou engenhos animados, etc. etc.), até o começo do século XVIII. A arte era, pois, um rito, uma cerimônia mágica encaminhada a estabelecer uma comunicação entre céu e terra, em altares de uma harmonia energética universal designada com o radiante nome de Beleza.

Igualmente Magia e Arte têm que ser conectadas de forma direta com o Amor, como sinônimo de União, que na prática cotidiana não só tem que se identificar com ideais românticos mas também com a faustuosa genitalidade da fêmea prototípica (vez por outra individualizada).

Não há nada mais valioso que a aventura do Conhecimento e sua seqüela, a energia do Pensamento, ou seja, os instrumentos motores da Arte que resolvem no prazer inefável da Contemplação. Eles não têm preço, na verdade, e se houver algo que pode ser chamado luxo é esta magia, que paradoxalmente se encontra ao alcance imediato de todo aquele que é capaz de interessar-se verdadeiramente nela; a qual, de mudança em mudança, vai produzindo uma autêntica transmutação interior.

Na realidade o Agartha, além de ser um método de Autoconhecimento é um tratado de arte teúrgica que se reconhece nas imagens ordenadas de uma cosmogonia e que se revela na organização da imaginação, mediante um rito preciso e, ai!, extremamente purificador, ao ponto de tocar os limites individuais e transpassá-los, prorrompendo no luminoso âmbito do Conhecimento e da metafísica, origem e fim de todo poder. Isto é válido tanto para as figuras do TARÔ, associadas a imagens mentais, como para tudo o que o aprendiz trabalhou com o modelo cabalístico da Árvore da Vida. O leitor possui agora um arquivo dinâmico de imagens e figuras às quais pode recorrer em qualquer momento. Inclusive esses símbolos repercutirão de maneira inconsciente nele e serão causa de novos efeitos que ao se transformarem outra vez em causas, assegurarão um trabalho mágico ininterrupto de participação no cosmo mediante arquétipos tradicionais que possibilitam a constante regeneração do plano do artista divino. Estas práticas rituais de recriação de imagens mediante a memória, levam à recordação do si mesmo, à "reminiscência" platônica; sobretudo quando a meditação sobre o objeto mágico que se deseja recordar se faz não só mediante a atenção concentrada, mas também quando esta, uma vez exercida, pode ser liberada e voar atrás de uma imaginação que nada tem de arbitrária, pois foi provocada e modelada por idéias-forças universais, energias sutis e vivas que finalmente terminam se manifestando em gestos existenciais, ao extremo não só de assinalar ideários definidos, mas também igualmente de determinar maneiras de ser e viver, critérios morais e normas de conduta. A palavra “re-conhecer”, que empregamos neste texto, quer dizer “conhecer duas vezes”. Em particular a utilizamos no sentido de voltar a conhecer o que já sabíamos, o que é o mesmo que descobrir a verdadeira identidade, intrínseca união com o Si Mesmo e seus indefinidos reflexos, que perenemente modificam e reconstroem o cosmo. Esse re-conhecer ritual, reiterado, é a razão de ser deste manual, sua autêntica essência, sua novidade permanente, e o propósito daqueles que o desenharam. Assinalaremos, embora não seja mais que uma coincidência, que o termo "reconhecer", em castelhano [N.T.: “reconocer”], é uma palavra rebis [N.T.: palíndromo], ou seja, que se pode ler tanto da esquerda para a direita, como da direita para a esquerda, o que constitui um exemplo cabal do que se entende por inversão.

 
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CABALA: O NOME - II

 

Para a Cabala o nome indica a essência do renomado e, portanto, a identidade. Isto é assim porque ela configura uma metafísica da linguagem, e como tal, as letras do alfabeto são produtos do Verbo e da Grafia divinos, de sua Palavra e de sua Escritura.

O nome divino, o Schem, está dotado de um misterioso poder total, e todo aquele que conhece ou participa de algum modo do conhecimento desse nome se encontra compartilhando automaticamente desse poder.

Não é, portanto, nada estranho que o nome de Yahvé não pudesse pronunciar-se (e inclusive escrever-se corretamente), posto que violar esta proibição equivaleria a brincar com um poder incontrolável, além de todo limite ou proporção. Por tal razão, tratava-se de nomear indiretamente, ou só por alguns atributos, à deidade –e em determinadas circunstâncias–, posto que todo nome sagrado leva um poder intransferível, um segredo que compartilha com todos os nomes; com qualquer coisa nomeada e até com a possibilidade de se nomear.

Isto outorga uma importância extraordinária à palavra e a sua expressão: a escritura, o que comporta transferir esta suprema valoração aos textos sagrados, em particular aos cinco primeiros livros de Moisés, e à Bíblia em geral, que será herdada pelas religiões "do livro": tanto pelo cristianismo (com o agregado do Novo Testamento) quanto pelo islã (Corão), o que se projeta em toda a cultura ocidental. Fazendo a condição de que estes textos não são letra-morta, mas sim palavra viva, permanente e atual, e o livro um organismo, com uma energia íntima, do qual constantemente surge uma nova luz, a verdade, para iluminar os segredos cosmogônicos e metafísicos, revelados e velados ao mesmo tempo. Certamente que isto modifica de forma substancial a relação entre o homem e a escritura e, portanto, a do homem com a leitura (reflexo por sua vez da que mantém com o nome e com a palavra), derivadas do pensamento e da consciência, que distinguem e singularizam o fenômeno humano. Por tal motivo, a concepção cabalística sobre o homem se encontra estreitamente ligada com a possibilidade de nomear, o que equivale dizer à de criar, ou re-criar, à de formar e re-formar o cosmo, que definitivamente não é mais que um conjunto de nomes proferidos pela Palavra divina.

Na letra está, pois, o sentido da criação, que foi realizada precisamente pelas combinações e permutações dos signos do Santo Alfabeto Cósmico, grafados pela pluma de Deus, cujo nome se tece de maneira oculta em cada uma dessas letras e em todas as palavras e nomes, inclusive nos espaços vazios que deixam livres os signos entre si.

Diz Orígenes que, tal como a magia, o nome e seu poder não são vãos e sem importância, mas, pelo contrário, uma ciência temível; desta forma, terá que utilizar com prudência e circunspeção estes nomes mágicos, cuja eficácia deriva de sua pronúncia em sua língua original, porque é precisamente o som o que atua.

Os doutores hebreus desenvolveram extensamente estes estudos, fundamentalmente orais, embora haja numerosos escritos destinados a despertar os gênios adormecidos mediante o chamado e a escritura de seus nomes, ou atributos, como o efetuaram todas as culturas tradicionais ou primitivas, embora não tenham produzido necessariamente uma linguagem alfabética, por se terem expressado por glifos ou emblemas ideogramáticos, ou de outra maneira análoga, mediante símbolos que fixavam o nome e, portanto, o que este representava, em perfeito acordo com a ordem cósmica.


fig. 34

 
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O LABOR COTIDIANO

 

Insiste-se novamente sobre a necessidade –quase urgência– do trabalho diário interno a aqueles que vão em busca do Conhecimento. Desgraçadamente a natureza do homem é tal que tende a esquecer o que verdadeiramente lhe interessa e procurou sempre, e é traído pelos sentidos, ao que se soma a determinação do meio social contemporâneo, absolutamente profano e afastado da autêntica realidade do que o mundo e o ser humano são e representam. Este condicionamento a uma imagem fixa, literal e falsa do que somos e o que nos rodeia, faz com que sejamos absorvidos pela inegável força da mediocridade do meio, que de indefinidas maneiras, inclusive com a violência e a "chantagem", trata de nos fazer participar do achatamento de seus valores.

O leitor de Agartha sabe que deve empregar todas suas energias nessa luta surda com o social (que está acostumado a se manifestar, às vezes, através da família) ao se enfrentar com essas concepções que ele, queira-o ou não, tem internalizadas mediante uma aprendizagem tão falsa quanto equivocada, estando a se enfrentar consigo mesmo e seus próprios enganos e misérias.

Várias armas tem o aprendiz de alquimista para vencer nesta guerra. A primeira é a paciência, uma forma de compassar o tempo; deste modo, possui distintos veículos para obter seus propósitos, que se foram indicando ao longo de nosso Programa. O objetivo destes trabalhos, deste treinamento que nos provê este manual, é obter a atenção concentrada, a reminiscência e lembrança de nós mesmos, e o conhecimento dos segredos cosmogônicos, com relação a abordar a metafísica e a contemplação, efetuando determinadas práticas e exercícios, como o estudo e a meditação e, igualmente, o cultivo de certas potências anímicas referentes às imagens visuais e mentais que se produzem em nós e que atuam como despertadores de consciência.

Mas o aprendiz do teúrgo sabe a esta altura do caminho percorrido que é obrigado à perseverança cotidiana, que se podem obter conquistas duradouras em sua realização. Por isso, vez por outra, insiste em seus trabalhos e fadigas, impulsionado pela fé na promessa que lhe foi dada (aquela de que obterá cem vezes mais do que tinha,) apesar de suas amarguras e graças a seu sacrifício. Razão pela qual é capaz de dizer “Redobro!”, em especial em circunstâncias difíceis, ou seja, naquelas em que se faz imprescindível um sobre-esforço e onde se vê não só como conveniente, mas sim como imprescindível, a realização do rito cotidiano, a única salvação em um mundo como o que nos tocou viver.


Por tudo isto é que nos permitimos recomendar novamente aos nossos leitores a releitura do Programa Agartha. Não só porque terá uma visão diferente do que aqui se diz, mas também porque em muitas coisas ela será como nova, a tal ponto você foi capaz de modificar seu critério, seu ângulo de visão. Este exercício lhe permitirá estabelecer comparações entre suas antigas concepções e as novas e estabelecer assim seu grau de "adiantamento", ou melhor: a porção do caminho espiral ascendido. Sua elevação do plano da visão literal, às sutis percepções de outras formas da consciência, que se constituem numa atmosfera diferente para o desenvolvimento do ser, a tal ponto que pode então se falar de um antes e um agora, de um homem velho e, portanto, de um homem novo, de uma metamorfose ou, muito melhor, de autêntica metanóia .

Deve-se, pois, seguir confiando na memória, que devidamente treinada pelo exercício e pelo estudo, pela escritura interna que imprimimos nela, constituir-se-á em uma energia constante, que atuará por si mesma, como se manifestasse uma ordem mágica e divina.

 
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QUIROLOGIA

 

À mão, que cumpre uma função de modelo simbólico, a Cabala lhe outorga um profundo sentido sagrado. Da mesma forma, outras tradições, como a Hermética ou o Islã (ver nesta última, por exemplo, a importância talismânica que possui a mão da Fátima, a filha do Profeta). As duas mãos unidas com seus respectivos cinco mais cinco dedos são uma imagem do modelo do denário arquetípico e, portanto, da realidade que expressa a Árvore da Vida Sefirótica. Mas o que hoje se entende por quiromancia ou quirologia (do grego kheir, mão) é um vestígio, muito desfigurado –como é também a Astrologia moderna–, pelo que outrora fora uma ciência de alcance espiritual e oracular. Haveremos, pois, de insistir em que todas as artes mânticas e adivinhatórias em geral assumem o verdadeiro sentido e função que lhes compete só enquanto emolduradas dentro de uma perspectiva espiritual e iniciática, do homem e do mundo, alheia a toda superstição e literalidade. Embora que isto seja assim, é obvio que nas mãos está impresso o mapa de nosso próprio destino e natureza, como também no rosto ou na própria configuração física. Em qualquer caso, já se sabe que todo o âmbito terrestre e corporal é um reflexo ou rastro de um modelo celeste, pelo que cada parcela de sua geografia é portadora de uma mensagem simbólica que está apenas manifestando esse modelo num nível (assim é, por exemplo, quando recém-nascido o Buda Sakyamuni, os sacerdotes decifraram seu importante destino espiritual partindo dos 32 signos impressos em sua pele).


Quirologia

fig. 36


A cada dedo, linha e região da mão se lhes atribui, efetivamente, uma correspondência com uma deidade determinada, vinculada, sobretudo, ao simbolismo astrológico e alquímico: o polegar a Vênus, o índice a Júpiter, o médio a Saturno, o anular ao Sol e o mínimo a Mercúrio. Entretanto, à hora de decifrar os diferentes sentidos e analogias simbólicas dos signos terá que se considerar a mutabilidade –e portanto relatividade– do mundo sensível e corporal, próprio do fenômeno e da mudança. Os signos da topografia física trocam de configuração em seus pormenores ao trocar constantemente também o próprio organismo e ainda mais até seu aspecto externo. Estabelecer, pois, sistemas muito rígidos de interpretação é se arriscar indevidamente a cair no engano de tomar algo relativo por algo absoluto. De fato, e tal e qual no caso da fisiognomia, cada tradição ou povo possui variantes próprias de interpretação, válidas na maioria das vezes para sua própria raça e ligadas a seus próprios parâmetros simbólicos, o que não quer dizer que, no fundo, não exista entre eles uma unanimidade essencial de sentido. Digamos, por último, que a mão esquerda está relacionada com o ancestral e a herança psíquica do indivíduo, com suas possibilidades latentes, enquanto que a direita o está com sua personalidade e sua atualidade, ou seja com a concreção efetiva de tudo o que, na esquerda, é potencial e instintivo; relação análoga à de toda a simetria microcósmica.

 
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CABALA

 

No começo de nosso Programa (Módulo I, título N.º 26), mostramos as correspondências entre o modelo do Árvore da Vida e o corpo humano. Ali propúnhamos umas correspondências e sugeríamos as visualizações adequadas a elas. Também dizíamos ali que em futuras práticas tentaríamos a inversão de polaridade de energias. Isso é o que faremos agora de acordo ao seguinte quadro:

Kether: o alto da cabeça
Hokhmah: olho e hemisfério cerebral direito
Binah: olho e hemisfério cerebral esquerdo
Hesed: braço direito
Gueburah: braço esquerdo
Tifereth: coração, plexo solar
Netsah: perna e quadril direitos
Hod: perna e quadril esquerdos
Yesod: as genitálias
Malkhuth: base, planta dos pés

No futuro, regularemos e ordenaremos nossas visualizações e exercícios respiratórios assim como nossas “especulações” (o espelho reflete sempre as imagens invertidas, tais como estão nossas mãos uma com relação à outra, e deste modo as duas metades dos hemisférios cerebrais) de acordo à presente versão, que não só é cabalista mas também se acha em correspondência com outras tradições.

Portanto a mão direita já não representará o rigor e a justiça, mas a misericórdia e a graça (Hesed) e será a mão de benzer. Igualmente Hokhmah será o olho direito e o hemisfério cerebral que representará a reta (ou direita) intenção (ver Módulo II, título N.º 43) e a coluna da esquerda se relacionará com o passivo, com o limitante e constritor. Esta é uma maneira radical de conjugar os contrários, por meio de um exercício prático que deve necessariamente unificar os opostos no eixo central.

A orientação que damos agora é especialmente válida para os povos do hemisfério norte e tem como referência a estrela polar, situada nesse ponto cardeal, o norte, para o qual se olha. A orientação que seguimos até o momento enfrenta o sul, e tem como guia o Cruzeiro do Sul, visível nesse hemisfério. O oriente e o ocidente se correspondem em ambas as situações com distintos braços no homem embora obviamente não trocam seu conteúdo essencial identificado com a saída e ocaso do sol.

 
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A ESTRELA E A ESPIGA

 

A viagem reiterada pelas dimensões do mundo do homem, à luz da estrela entrevista no segundo de um outro tempo, mais atemporal, próximo às origens, viagem de reconhecimento das direções qualitativas da caixa-cubo do cosmo, é também o reconhecimento da obra de arte sagrada, que possui a qualidade do holograma, obra também da luz, em que a parte contém imanentemente o Todo. O mundo do homem é um todo unitário, um jogo de relações e tensões que se equilibram em seu centro sempre virginal. Essas viagens não são distintas da compreensão que a alma realiza reconhecendo suas qualidades, seu desenho, sua forma prototípica, assinalada pela divina proporção que nasce da relação da Estrela com a circunferência de seu limite. Essa regra de ouro, ou proporção áurea, é o verdadeiro nome das coisas, sua realidade no Homem primordial, que as resgata devolvendo o mundo a seu Princípio, na síntese de sua morada originária.

Mas o encontrar a Estrela, selo da verdadeira vida do mundo do homem, é também encontrar a morte, não como a entende o mundo profano, mas sim no nome de outra luz, mais que inteligível, não cósmica, com relação à qual a anterior não é mais que um pálido reflexo. Efetivamente, o mesmo que dá a vida, sinalizada por isso mesmo com a morte. A afirmação do ser oculta tudo aquilo que só pode ser expresso em termos negativos, por ser inefável. No coração do templo, o altar, centro onde se equilibram as influências do celeste e do terrestre, do vertical e do horizontal, pode ser produzido um sacrifício secreto, caracterizado pelo abandono de todo reflexo, no qual o oficiante e a vítima sejam um só. Tudo foi dado e tem que ser devolvido, com a gratuidade própria de uma Realidade que nunca se viu a si mesma como proprietária, pois é Não-Dual.

A espiga, que o Sol fez crescer, mostrando-se sobre o meridiano, não poderia seguir crescendo indefinidamente. Seu próprio peso, que deve à Terra, inclina-a sobre si mesmo, traçando o anagrama de um Nome arquetípico pelo que são feitas novas todas as coisas.

 
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ALQUIMIA

 

Geralmente quando se fala da Ciência Alquímica se pensa naquela referente ao reino mineral, cujo objetivo é a realização do ouro metálico através da pedra filosofal. Esta forma da Arte Régia é a transmutação que se produz no atanor ou forno por meio de diferentes procedimentos e etapas que o adepto relaciona com seu próprio processo iniciático interno, análogo a qualquer gestação, começando pela do Universo. Entretanto, já mencionamos a alquimia vegetal como uma possibilidade idêntica, que utiliza o próprio corpo humano como um atanor e persegue exatamente os mesmos fins, ou seja, os da plena realização das possibilidades humanas por meio da constante conjunção das energias opostas, que jazem no fundo de sua alma. Também devemos mencionar uma alquimia desenvolvida através da respiração, que pretende fixar o hálito vital (o prana dos hindus) como alimento constante fluídico e permanente da criação íntegra.

É necessário esclarecer que todas essas formas da alquimia são igualmente válidas e são referentes a idênticos princípios cosmogônicos que se manifestam de igual modo essencialmente, embora as formas de se expressarem sejam diferentes, razão pela qual são válidos os mesmos símbolos e a sucessão das operações descritas na alquimia metálica (começando pelo mercúrio), embora a matéria prima a se empregar seja diferente. Caberia também aqui assinalar a alquimia sexual como outra modalidade operativa, intimamente ligada ao que no hinduísmo e o budismo se denomina tantra. Todos estes aspectos têm em comum a idéia de uma regeneração e por isso estão ligados a conceitos referentes à “longa vida”, “medicina universal” e inclusive à “imortalidade”, o que é claro no Taoísmo.

Também queremos sublinhar que a alquimia foi chamada a ciência dos espelhos, e que estas especulações constituem em todos os casos uma ordem consecutiva de dissoluções e sublimações, dissociações e associações, de mortes e ressurreições que não são indefinidas nem se perdem no vazio de um gesto tão reiterado como banal, mas sim aspiram a uma conquista final, na qual elas, e portanto a alquimia, adquirem seu verdadeiro sentido.

 
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VIRGILIO-DANTE  I

 

É bastante freqüente, na história das civilizações tradicionais, o fato de que quando estas, por imperativos cíclicos, estavam a ponto de desaparecer, a doutrina metafísica e cosmológica que ordenou sua cultura e sua vida tenha se refugiado nas obras de determinados personagens chave, e isso com o propósito de que dita doutrina não se perdesse definitivamente. O destino dos homens de Conhecimento que vivem durante esses períodos críticos está, em parte, sujeito a essa missão de salvaguarda. Tal é o caso de Dante em relação à Idade Média. Foi em "A Divina Comédia" onde Dante recolheu e plasmou o essencial do esoterismo cristão que estava representado por certos grupos artesanais, herméticos e cavalheirescos, como a Ordem Templária. Como já dissemos em um parágrafo anterior, a própria organização a que pertencia Dante, os "Fiéis de Amor", passava por ser um ramo da própria Ordem do Templo, pelo que é de se supor que, quando esta desapareceu em 1314, os "Fiéis de Amor" tenham continuado a manter –embora em forma mais oculta e velada– grande parte do ensino iniciático e tradicional que detinham os cavaleiros templários. É esta herança espiritual que na verdade constitui o eixo medular que sustenta toda "A Divina Comédia", e qualquer leitura que desta obra se faça deve ter em conta este dado, quando se deseja conhecer o profundo sentido que encerra.

Entretanto, existe a presença de outras fontes tradicionais no poema de Dante, coisa que não é de se estranhar tendo em conta a encruzilhada de culturas que confluíram na época medieval. Concretamente nos referimos à presença da tradição greco-latina, representada na Comédia por Virgílio, a quem Dante chama mestre, senhor e guia. Virgílio foi, com respeito à tradição greco-latina, o mesmo que Dante com relação ao esoterismo cristão: um iniciado que conservou em suas obras, especialmente no Geórgicas e na Eneida, o essencial de sua cultura. Na Eneida, por exemplo, encontramos uma série de dados relacionados com a doutrina dos ciclos, e sem dúvida Dante se serve deles na Divina Comédia. Tudo isto nos indica que a tradição representada por Virgílio continuava viva nos tempos de Dante, e continuaria estando para além destes, como fundamento que é da própria cultura e da história sagrada do Ocidente, e cuja herança recebemos todos os nascidos nele, sejamos ou não conscientes disso.

Centrando-nos no ponto de vista do processo iniciático, e considerando que com respeito a ele a história e a geografia sagradas –assim que expressam as leis universais– também constituem um dado importante a ter presente, pode se dizer que a tradição greco-latina representa para Dante o legado de seus ancestrais ou antepassados; um legado impresso por “consangüinidade espiritual” na alma do poeta florentino. Quando em sua “viagem” Dante acede à região intermediária do mundo sutil, simbolizada pelo “limbo”, e contempla as almas dos justos que ali moram (a de Homero, Enéias, Heitor, César, Ovídio, Horácio, Orfeu, Pitágoras, Sócrates, Platão, Aristóteles, Sêneca, Heráclito, Zenão, Diógenes, Anaxágoras, Tales, Empédocles, Euclides, Ptolomeu, etc.), “re-conhece” em si mesmo essa herança tradicional, sendo graças a ela, e junto a seu mestre Virgílio, que pode acometer seguidamente o duro e perigoso descenso pelos círculos infernais, que supõem uma imersão no aspecto mais tenebroso da psique: os prolongamentos mais inferiores do estado humano, que devem ser esgotados definitivamente antes da ascensão ou subida aos céus e aos estados superiores.


fig. 37

 

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